Reprodução da entrevista publicada pelo Jornal DIÁRIO DA MANHÃ
Garibaldi Rizzo discorda dos projetos de habitação de interesse social ser colocados somente na periferia(Foto:Edilson Pelikano)
Arquitetos e urbanistas avaliam que projetos de moradia popular não podem ser novos guetos na periferia das grandes cidades
Hélmiton Prateado,Da editoria de Política&Justiça
O presidente do Sindicato dos Arquitetos e Urbanistas de Goiás, Garibaldi Rizzo, encabeça um grupo de estudos que discorda dos projetos de habitação de interesse social serem colocados somente na periferia. O principal problema gerado, segundo Garibaldi, é quanto à sobrecarga no sistema de transporte urbano de passageiros.
Garibaldi lembra que o ex-presidente da Federação Nacional dos Arquitetos e vereador por São Paulo Nabil Bonduki pontuou a importância de pensar o desenvolvimento das cidades como um todo. “Com conjuntos habitacionais concentrados na periferia, não há sistema de mobilidade urbana que dê jeito”, completou, referindo-se ao avanço de programas, como o “Minha Casa, Minha Vida”, sem a devida proporcionalidade em outras áreas. Ele reforçou que não bastam anúncios de bilhões sem planejamento. É preciso dar um novo salto. “O Ministério das Cidades está engessado.”
Segundo a pesquisadora Maria Ozanira Silva e Silva, autora do livro Política Habitacional: verso e reverso: “A habitação não pode ser concebida como mero abrigo, pois ela representa a porta de entrada dos serviços urbanos”. Garibaldi Rizzo enumera as razões para repensar a implantação de projetos de habitação de interesse social.
A ENTREVISTA
DM – O que se considera moradia adequada do ponto de vista social?
Garibaldi Rizzo – A habitação de interesse social não é só quatro paredes. As paredes servem como endereço e ponto de referência, estrutura familiar, aconchego, mas a luta por moradia envolve outras necessidades como o emprego para manter a casa, educação para os nossos filhos, saúde, lazer, transporte. Sem isso, só a casa não tem sentido. A política habitacional tem que ser pensada também levando em conta questões mais humanas, como a questão da renda. Moradia adequada é um lugar na cidade, um ponto a partir do qual se tem acesso a condições dignas, emprego, comércio, equipamentos sociais, a um espaço público de qualidade, à cultura. Vai além do abastecimento de água, luz, pavimentação, sistema de esgoto, que também são necessários.
DM – As políticas públicas de habitação de interesse social são satisfatórias?
Garibaldi Rizzo – Ocorreram alguns avanços significativos nos últimos anos na área de habitação, principalmente no financiamento em políticas sociais para o enfrentamento da precariedade social. Citem-se, como exemplos, as políticas para habitação de interesse social e os subsídios para custeamento de materiais de construção a preços relativamente acessíveis para a população de baixa renda, inseridos no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC2) e no Programa Minha Casa Minha Vida (PMCMV) e em nível do Estado de Goiás o Programa Cheque Moradia. Adquirir uma casa representa o maior investimento de uma vida. Somos conscientes da importância da Política Nacional de Habitação para o País e para os municípios.
DM – Qual é o papel do Ministério das Cidades em relação à habitação no País?
Garibaldi Rizzo – O Ministério das Cidades através da Secretaria Nacional de Habitação (SNH) é responsável por acompanhar e avaliar, formular e propor, os instrumentos para a implementação da Política Nacional de Habitação, em articulação com as demais políticas públicas e instituições voltadas ao desenvolvimento urbano, com o objetivo de promover o acesso à moradia. Nesse sentido ele desenvolve e coordena ações que incluem desde o apoio técnico aos Estados e municípios e aos setores produtivos até a promoção de mecanismos de participação e controle social nos programas habitacionais.
DM – Qual é o papel do governo Estadual em relação à habitação em Goiás?
Garibaldi Rizzo – A Secretaria de Meio Ambiente, Recursos Hídricos, Infraestrutura, Cidades e Assuntos Metropolitanos é responsável por formular e coordenar a implementação da política estadual de habitação, em articulação com órgãos das esferas federal, estadual e municipal; a política fundiária urbana e imobiliária estadual, objetivando a regularização fundiária e a promoção pública de alcance social de moradias ou lotes; estudos, pesquisas, tecnologias e novos materiais, objetivando a melhoria da qualidade, rapidez na execução e redução dos custos da habitação popular; ações de apoio técnico na área de engenharia pública e social, prestando assistência aos municípios, às instituições públicas e entidades da sociedade civil organizada.
DM – E a Agehab, o que faz?
Garibaldi Rizzo – A Agência Goiana de Habitação (Agehab) é responsável, em Goiás, pela execução da política pública de habitação voltada para o desenvolvimento urbano, com o objetivo de promover a universalização do acesso à moradia. A Agehab é uma empresa do Estado de Goiás, resultante da fusão da Companhia de Habitação Popular do Município de Goiânia (Cohab), criada em 1965, e da Companhia Habitacional do Estado de Goiás (Chego). Ela é jurisdicionada à Secretaria de Meio Ambiente, Recursos Hídricos, Infraestrutura, Cidades e Assuntos Metropolitanos .
DM – O que é déficit habitacional?
Garibaldi Rizzo – Déficit habitacional é uma expressão que se refere à quantidade de cidadãos sem moradia adequada em uma determinada região. O Ipea, utiliza três critérios para definir moradia inadequada: a rusticidade das estruturas físicas das habitações (uso de materiais não duráveis e/ou improvisados), a moradia não ser originariamente construída para habitação, adquirindo essa função apenas de forma esporádica ou improvisada, a coabitação (a existência de mais de uma família por residência).
Com déficit de quase oito milhões de moradias, o País tem necessidade imediata de buscar a solução que permita atender a tal demanda. Essa quantidade de habitações a ser construída equivale a quase 15% do total de unidades existentes no território nacional (54,8 milhões). Em Goiás este número é de 165 mil moradias.
DM – O que é regularização fundiária?
Garibaldi Rizzo – A regularização fundiária consiste no conjunto de medidas jurídicas, urbanísticas, ambientais e sociais que visam a regularização de assentamentos irregulares e a titulação de seus ocupantes, de modo a garantir o direito social à moradia, o pleno desenvolvimento das funções sociais da propriedade urbana e direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. O sistema, normalmente implantado através dos governos estaduais, estabelece os limites de cada terreno de forma que este seja registrado corretamente no cartório em nome do proprietário. Com a regularização, o governo garante segurança social e jurídica para os pequenos agricultores e moradores de assentamentos precários em áreas urbanas.
DM – O que é reforma urbana e o Estatuto das Cidades?
Garibaldi Rizzo – Aprovado após 12 anos de tramitação, o Estatuto da Cidade (Lei nº 10.257, de 10 de julho de 2001) oferece aos governos municipais e aos movimentos sociais um conjunto expressivo de instrumentos que, na prática, buscam materializar o “direito à cidade”, definido na própria lei como: o direito à terra urbana, à moradia, ao saneamento ambiental, à infraestrutura urbana, ao transporte e aos serviços públicos, ao trabalho e ao lazer, para as presentes e futuras gerações. O Estatuto da Cidade pode ser especialmente útil para a imensa e interminável tarefa de reduzir o “apartheid social” expresso nas cidades brasileiras. No Estatuto da Cidade, o objetivo da política urbana (ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade) pode ser traduzido em quatro grupos de propósitos: promover a gestão democrática das cidades, oferecer mecanismos para a regularização fundiária, combater a especulação imobiliária e assegurar a sustentabilidade ambiental, social e econômica dos núcleos urbanos.
DM – O que é o Conselho das Cidades?
Garibaldi Rizzo – É órgão colegiado de natureza deliberativa e consultiva. Em relação à Política Nacional de Habitação, tem algumas atribuições centrais especialmente no que tange às prioridades, estratégias, instrumentos e normas da Política, além de fornecer subsídios para a elaboração do Plano Nacional de Habitação, acompanhar e avaliar sua implementação, recomendando providências necessárias ao cumprimento dos objetivos da política.
DM – O que o município deve fazer para aderir ao Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social?
Garibaldi Rizzo – O primeiro passo é a assinatura do termo da adesão, pois é por meio deste instrumento que se formaliza junto ao Ministério das Cidades a inserção ao Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social. A inserção do ente ao SNHIS é confirmada após a publicação do extrato no DOU.
A assinatura do termo de adesão implica os seguintes compromissos no âmbito dos Estados, DF e municípios:
- A criação do Fundo Local de Habitação de Interesse Social;
- A instituição do Conselho Gestor do Fundo Local de Habitação de Interesse Social;
- A elaboração do Plano Local de Habitação de Interesse Social;
- A elaboração dos relatórios de Gestão dos Fundos Locais de Habitação de Interesse Social.
DM – Como a gestão municipal deve tratar a habitação?
Garibaldi Rizzo – A habitação não deve ser vista de forma setorial e como o principal agente gerador de desenvolvimento, e sim como um setor que possibilita reordenar territorialmente as ações no setor habitacional na esfera municipal, associando-a investimentos nos demais setores. Além disso, o ato de planejar a habitação pressupõe a promoção à participação da sociedade civil nas esferas de diálogo e tomada de decisões. O primeiro passo é diagnosticar o potencial da habitação local, através do mapeamento das condições da exploração econômica, e em seguida relacionar construção das unidades habitacionais de interesse social a infraestruturas, com transporte, escolas, entre outros. A realização do mapeamento da situação habitacional e da provisão de habitação de interesse social, articuladas às esferas municipal, estadual e federal, potencializa a redução de moradias precárias, desacelerando o crescimento desordenado e promovendo condições adequadas a uma parcela significativa de cidadãos, desde que a habitação esteja atrelada ao trabalho social. O financiamento no setor habitacional promove o crescimento de emprego e renda na esfera do município, daí a necessidade de ser planejado e articulado ao Plano Diretor e aos demais planos.
“As paredes servem como endereço e ponto de referência, estrutura familiar, aconchego, mas a luta por moradia envolve outras necessidades como o emprego para manter a casa, educação para os nossos filhos, saúde, lazer, transporte”
Garibaldi Rizzo
“Adquirir uma casa representa o maior investimento de uma vida. Somos conscientes da importância da Política Nacional de Habitação para o País e para os municípios”
Garibaldi Rizzo
“Ocorreram alguns avanços significativos nos últimos anos na área de habitação, principalmente no financiamento em políticas sociais para o enfrentamento da precariedade social”
Garibaldi Rizzo
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