Projetar é uma forma
de ver o que não existe e, a partir disso, construir. Desenhar projetos não é
coisa só de arquiteto, é coisa de todos nós.
Ver o que não existe
é próprio do ser humano. Olhamos um objeto, uma cena e juntamos a eles toda uma
interpretação.
O olhar humano é
projetivo, o que quer dizer que projetamos naquilo que olhamos todo um universo
de sentidos que já carregamos e que descarregamos sobre o que vemos.
Olhar objetivo não
existe para o ser humano.
Há somente o olhar
projetivo – que projeta o que tem aninhado nas nossas mentes e que se acopla
aos fatos e acontecimentos, fazendo deles outra coisa, adulterando-os ao nosso
bel-prazer ou segundo nossa capacidade.
O olhar projetivo
também – vejam só que coisa grandiosa – inventa projetos. Desenhamos projetos
quando olhamos algo e dele dizemos o que é.
É como um projeto de
arquiteto mesmo. Ao interpretarmo-lo, estamos desenhando o projeto e ao mesmo
tempo construindo-o. Somos arquitetos e pedreiros de nossa existência!
Aquela pessoa que
“vê” que o outro é sempre desonesto, por exemplo, vai distribuindo olhares de
desconfiança, desenhando o “projeto-desconfiança” que começa a atrair outros
olhares desconfiados. Acaba por atrair pessoas de fato não dignas de confiança
que se aproximam pelo cheiro conhecido.
Ou a pior e mais
frequente possibilidade: a pessoa desconfiada nem está cercada de pessoas
desonestas, mas como assim as vê, vai interpretando a realidade projetiva como
sendo a verdade e vai “vendo” até que não consegue ver as evidências, não
consegue ver mais nada fora da sua projeção. O mundo não lhe convence do
contrário. As evidências contrárias à sua “certeza” não são recolhidas e
reconhecidas e assim o seu mundo passa a ser a sua projeção.
Termina o ciclo e aí
o projeto virou construção.
Tem uma história
bastante ilustrativa que um amigo me contou de sua namorada. Ela,
superciumenta, tanto o atormentou dizendo que ele havia olhado para fulana ou
que beltrana estava olhando para ele que acabou por suscitar nele o interesse
pelas tais.
Não deu outra coisa:
o cara foi no caminho que ela projetou para ele e a história terminou em
traição – o que ela não queria, mas construiu através de seu olhar projetivo
que antecipava o acontecido. Ao me contar a história de décadas atrás, ele,
sorrindo, afirmava que aquela tinha sido a namorada perfeita, pois lhe
arranjara um monte de outras namoradas, despertando-o para possibilidades nas
quais ele nem tinha pensado. Foi a namorada que o despertou para o que só
existia para ela mesma e que, com o tempo, passou a existir para ele também.
Ao crer que algo é de
um jeito, ele já “começa a ser” mesmo.
Como no dizer de
Simone de Beauvoir, a maior filósofa francesa do século 20: “Quando pensamos
que não amamos, começamos a amar menos.”
Assim acontece.
Olhamos, vemos, interpretamos. Construímos a casa e entramos dentro para viver
nela.
É assim que o ser
humano cria a sua realidade subjetiva, o universo interno no qual ele vive com
todos os personagens que cria, pois a interpretação é dele.
Já tive várias
experiências de conhecer alguém descrito como, por exemplo, mal-humorado,
fechado, e que pude ver como espirituoso e divertido. Mas para aqueles que não
o viam dessa forma ele acabava se conformando à visão que tinham dele.
A visão do outro nos
aprisiona onde ele nos vê. Se não saltarmos fora, acabaremos por nos tornar
aquilo que o outro vê que somos.
A interpretação –
como vemos o que vemos – é o nosso modo de fazer o projeto com o qual
construiremos a nossa vida.
Projetamos o que está
dentro de nós e fazemos fora o que está dentro.
O olhar projetivo
também – vejam só que coisa grandiosa – inventa projetos. Desenhamos projetos
quando olhamos algo e dele dizemos o que é.
By Luciene Godoy
Enviado por Mariana S. D Pedrosa
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